Saturday, June 27, 2009

My dear Larry

Depois de um ano sem cá vir, mais de um ano até.

E hoje fez sentido voltar, pois não quero acabar de ler o Fio da Navalha e ficar sem saber mais nada sobre Larry para sempre.

Nunca se fizeram rapazes assim. Não é só de agora. Somerset mentiu-nos.

Ainda bem.

Saturday, April 26, 2008

dont walk away, in silence

passaram-se alguns meses. eu acreditei que o vi, ian era assim mesmo. enfim, aquilo foi escrito pela mulher e pelos amigos, tão próximos. ou talvez não. estavam todos longe, ele também, longe de si.

as músicas são perfeitas para caberem nas nossas míseras vidas. não que tenhamos verdadeiros abismos nas nossas míseras vidas. as nossas míseras vidas nunca serão como a dele. e, no entanto, ouvimos atmosphere, digital, she's lost control, e, por um instante, julgamos que tudo aquilo foi para nós, que somos todos iguais, o desespero afinal toca-nos a todos.

mas não. ian não pensou em nós. não nos dá a mão quando nos sentimos tristes.

ian só fez música porque não sabia fazer mais nada. não conseguia aproximar-se. não sabia esperar. não sabia falar. não sabia mostrar o que sentia. e daí a música, expressão única possível. a música que fala dele, da mulher, da amante, da sua vida, de nada mais.

e nós, incautos. identificamo-nos com todas elas sem saber a sua história. sem perceber que é um crime usá-las para as nossas míseras vidas.

Friday, March 21, 2008

Duas balas e um amigo

Duas balas e um amigo.
O outro nem sequer era amigo.
Mas fez o que tinha de ser feito, pensa.
Agora o bófia jaz por entre as prateleiras de bebidas e sandwiches.
(Não há mais mulher para ti.)
A cara do morto está tão branca como o pão de forma que caiu entretanto.
(Não há mais sexo ou jantar à espera.)
E o sangue que escorre pelo seu pescoço é ainda mais vermelho do que a embalagem do pão.
O outro, que filho da puta.
Não pára de gritar, esbraceja e gesticula.
Mas ele já nem ouve.
(A criança no ventre quente olha-o com desprezo.)
Ferra o lábio com raiva.
(Uma criança sem pai, ainda mais uma neste mundo.)
Tudo num minuto, tão rápido como o arrependimento.
(Provavelmente acabará como ele a roubar bombas de gasolina pela madrugada.)
Os olhos traem-no e deixam escapar uma lágrima.
Entraram, e depois o bófia.
Azar.
Não, não é azar.
Azar é não apanhar o comboio.
(Os lábios carnudos e negros da mulher, bonitos demais para esperarem.)
O dono da loja, velho irritante, gagueja de pânico.
Já se deve ter mijado de medo, por trás do balcão.
(Cala-te velho, não vai haver mais mortes hoje.)
E o outro, filho da puta, quer ir-se embora.
Com o bófia estendido nos azulejos sujos.
(Ontem tirava fotocópias, tinha até algum talento.)
Foi tudo culpa do outro, que cabrão, ficou a olhar para o Porsche, ainda por cima não se cala.
(A casa minúscula e com infiltrações hoje não lhe parece tão ruim.)

Fecha os olhos e lembra-se da janela grande que dá para o rio.
E a segunda bala ficou alojada entre a sua orelha e sobrancelha esquerdas.

Thursday, February 14, 2008

Tricko

Ando preguiçosa e sem vontade para escrever. Entretanto, faço um pouco de batota e mostro esta curta-metragem feita por um senhor eslovaco, chamado Martin Fazeli, em 2006.

Nada de grandes mestrias técnicas, mas bom, o cinema não é só isso. Bastantes erros, baixo orçamento, actores medíocres, um momento pouco convincente e uma ideia muito interessante:



Tuesday, January 29, 2008

boats and birds


para quem ainda souber ouvir uma história para adormecer.

na verdade, é tão riquinha. mesmo com o filme naif e duvidoso. deixei-me levar e os olhos brilharam.







game over


Pintei os lábios de vermelho vivo, peguei num lápis Caran d'Ache preto e borratei os olhos, pus uma Nossa Senhora dos chineses ao pescoço, levei uma camisola transparente e gigantesca e despenteei o cabelo. Perfeita. Pensei. Claro que me havia de arrepender daquela fotografia tão vinculativa. Óptimo. Estou na idade para isso.

Penso que foi por isso que ela não gostou de mim. Olhou para mim de canto por detrás do balcão. Era feia e tinha mais de 50 anos. E perguntou-me:
- Então não há alterações? Nem morada, nem estado civil?
- Não não, é tudo igual.

Nestas situações as pessoas têm uma tendência parva para dizerem piadas estúpidas. Saiu-me:
- E altura também não, infelizmente.
E dei uma risadinha. Ela não gostou. Interpretou-a como uma risadinha de quem se ri e ludibria ao mesmo tempo.
- Isso vamos já ver. Meta-se aí à beira da tábua.

E eu, submissa, obedeci. Pus-me em cima da plataforma preta e estiquei-me e encostei-me à tábua.
- Ora bem, um metro e sessenta e dois - afirmou ela.
E eu sorri. Segundo erro. Ela viu e acrescentou:
- Mostre-me os seus sapatos, se faz favor.
Mostrei. Eram umas botas sem tacão.
- Isso tem 4cm, portanto fica com 1,58.
Eu olhei espantada, tanto para ela como para as botas. No way. Aquilo não tinha 4cm. Então reivindiquei:
- Isto não tem 4cm. E eu no bilhete anterior tinha 1,59m.
Enfureci-a. Gritou-me:
- Ah é? Está a dizer-me que não sei calcular as medidas dos tacões? Não acha que é isso que faço todos os dias? Se eu digo que tem 4cm é porque tem, está a perceber?

Merda. Não devia ter posto o baton vermelho. Ou seria a Virgem?
- Quer ver? Ó Dona Fernanda, venha cá! - chamou.
Eu continuava calada, a pensar na Virgem e no lápis Caran D'ache. A Dona Fernanda era uma estagiária, também muito feia. Veio rapidamente como um cão treinado.
- Mostre-me as botas outra vez. Dona Fernanda, não acha que aquilo tem quaaatro centímetros?

Cabra. Poder de sugestão é terrível. E ela disse o quatro de forma escandalosamente arrastada.
- 4cm? Ah pois tem, pois tem. Ou até 4cm e meio...
- Ora aí está. Olhe, já agora, encoste-se aí outra vez à tábua. Dona Fernanda, a senhora que está mais perto, diga-me, a menina chega ao 1,62 ou não chega bem?
- Deixe cá ver... Não, não chega ao 1,62, faltam cerca de 2mm.

Game Over. Sem qualquer misericórdia,  vangloriou-se:
- Pois muito bem, aqui não há arredondamentos! Se não chega aos 1,62 é 1,61. Tira-se os quatro e fica 1,57m!

E foi assim que fiquei com menos 2cm. E talvez tenha sido a Virgem que me tramou.




Saturday, January 19, 2008

o vendedor

Os estofos de couro dão o toque de classe, veja lá. Não acha que merece? Repare neste magnífico suporte para copos. Repare bem que o leitor dá para 5 CD's, tão prático, não ter de estar a tirar e meter o seguinte. Considere uma prenda a si próprio. A sua mulher vai adorar estes sensores de estacionamento. 

Manuel já não se lembrava com nitidez de como tinha acabado naquele emprego odioso. Recordava-se de estudar História, gostava muito. O pai morreu de repente, ele era o filho mais velho. Sim, fora assim que começara a trabalhar como vendedor de carros quase novos, que ainda por cima são os mais difíceis de vender.  E Manuel nem sequer apreciava carros, gostava mais de ler e de caminhar sem rumo.

Como tinha comprado recentemente um minúsculo apartamento, cozinha na sala e quarto de banho no quarto, Manuel andava a trabalhar sem parar. Andava tão exausto que apenas conseguia ver uns minutos de televisão antes de adormecer. Deixou de ir a casa da mãe almoçar e de combinar encontros com os amigos. Nem sequer conseguia combinar nenhum café ou jantar com Joana, uma mulher bonita e agradável que tinha conhecido há uns meses atrás. Todos os dias pensava nela, nos pulsos finos e nos ombros rectilíneos, nos seios atrevidos e nos olhos cor de amêndoa.

Até que chegaram as férias. Nessa noite não conseguiu dormir, apesar de cansado. Passou horas a escrevinhar tudo aquilo que gostaria de ter feito e que agora tinha tempo para fazer. Sentia saudades de conversar com Joana, e por isso decidiu que seria a primeira prioridade. Combinaram um café para o dia seguinte.

Manuel acordou uma hora mais cedo do que o suposto. Sentiu-se tão excitado que não conseguiu tentar adormecer outra vez. Antes de ir ter com Joana foi comprar-lhe uma linda orquídea branca e púrpura, plantada num delicado vaso de argila. Sentia-se verdadeiramente feliz.

Chegou mais cedo ao café do que o previsto. Um sofá verde corria ao longo de toda a parede. Amavelmente, optou por se sentar na cadeira, deixando o lado mais confortável vago para ela. Pediu uma limonada e foi bebendo-a em pequenos goles.

Finalmente chegou. Veio atrasada, de sobretudo e boina. Que bela criatura, pensou. A criatura aproximou-se rápido, sentou-se à sua frente e disse:

- Com que então olá.
- Olá, que bom ver-te. Como estás?
- Que bom ver-te? Que bom ver-te?
- Sim claro, já não estava contigo há tanto tempo.
- Eu telefonei-te, Manuel. Várias vezes.
- Sim, eu sei. Desculpa, estava a trabalhar, não pude atender.
- E depois ainda tinhas a lata de me telefonar às 23h da noite.
- Pois, só conseguia...
- Era para sexo?
- O quê?
- Às 23h, Manuel, às 23h. Um bocado tarde para jantar, não? E tu nunca tomavas café.
- Joana, não estou..
- Ó meu cabrão, e depois ainda me convidas para um domingo romântico? Sexo durante a tarde também? Só vim aqui para dizer que odeio gente como tu. Vendedores. Enganam toda a gente para terem o que querem. Mas a mim não me fodes mais, percebeste?! Cabrão..

Joana estava em estado de fúria exponencial. Mal acabou de dizer a última palavra, pegou no copo de limonada e atirou o seu conteúdo à cara do incrédulo homem. Depois pegou na orquídea e saiu do café tão rápido como havia entrado.

Manuel não compreendeu. Ela também não. E o "cabrão" continuou a ser a última palavra para sempre, pois nunca mais se viram, encontraram ou falaram.




Tuesday, January 1, 2008

1 janeiro

1 de janeiro
dia perigoso
é sempre complicado
não ir abaixo
sem saber porquê.

1 de janeiro de 2008
começar logo por ouvir the cure, sem medo.
mesmo sabendo como também é tão arriscado.

música mais do que apropriada:
doing the unstuck
it's a perfect day for letting go
for setting fire to bridges
boats
and other deary worlds you know
let's get happy!
it's a perfect day for making out
to wake up with a smile without a doubt
burst grin giggle bliss skip jump and sing and shout
let's get happy!
...
but it's much to late you say
for doing this now
we should have done it then
well it just goes to show
how wrong can be
and how you really should know
that it's never too late
to get up and go..



2008
sem resoluções nem balanços.
8 de março lá estarei, a ouvi-los.
e espero que me cantem aquele meu início favorito:

just like heaven
"show me how do you do that trick
the one that makes me scream" she said
"the one that makes me laugh" she said
and threw her arms around my neck
"show me how you do it
and I promise you I promise that
I'll run away with you
I'll run away with you"






Friday, December 21, 2007

rio-me e estou do contra

eu 2: não adoras aquelas pessoas que escrevem com palavras complicadas?
eu 1: não.
eu 2: e aquelas que escrevem textos sobre a descoberta, e o amor e o raio que o parta?
eu 1: normalmente não, poucos se safam.
eu 2: tu fazes isso.
eu 1: pois faço... mas também não gosto muito do que escrevo.
eu 2: ah.. olha, podia ser pior.
eu 1: pois, tenho visto que sim.

naquele preciso minuto

estavam juntos há tanto tempo. e de repente o primeiro pergunta:
- quem és tu?

e o segundo explica:
- sou a pessoa que amas.

e ficaram juntos durante muito mais tempo. até que o segundo pensou alto:
- o que estou aqui a fazer?

e o primeiro responde:
- esta é a nossa casa, somos casados e gostamos muito um do outro.



um dia lembraram-se os dois ao mesmo tempo:
- o que estou a fazer contigo?

e como não houve ninguém que respondesse naquele preciso minuto, despediram-se felizes e deixaram a casa vazia.
e pensar que podia nunca ter acontecido.

Monday, December 17, 2007

Sing it yourself

Sing it yourself

How to use it: 
Take the lyrics and create your own tune. 
If you're doing this for the first time, try to use a tune that you already know. 
In the end each person will have a different and fabulous version.

Piece of advice:
It will work better on the shower.

Lyrics:
and you say:
na
na na
na na
na na na na na

If you're feeling lucky:
Try to develop the lyrics and the tune.
With the help of your imagination, try to create new instruments
(from things you have near you, like a spray deodorant)


just like they did it:
au revoir simone - hurricane
...
and you say:
na
na na
na na
na na na na na
...
this message is for all the people
that people who are always waiting
this message is for all the people
that people who are always waiting
waiting, waiting, waiting, waiting, waiting, waiting

Saturday, December 15, 2007

the cook the thief his wife and her lover

É um filme desagradável. Provavelmente, muitos serão aqueles que não gostarão de o ver, mas todos vão ficar, de forma mais ou menos marcada, afectados. Quanto a mim, fascina-me a coragem com que Greenaway transpõe o limite da arte cinematográfica, e, em relação a isso, é impossível ficar indiferente. Fala de luxúria, assassínio, traição, gastronomia. Uma aventura surrealista, cheia de cor e contraste, que se afasta tanto da realidade como prima pela beleza da artificialidade.




Em relação à história, que é apenas uma parte da história, começa com a apresentação da personagem principal, o tirano Albert Spica, um excêntrico mafioso sem escrúpulos. Sempre a reclamar, o ladrão acaba por ser responsável por mais de metade do texto total do filme. As paixões deste homem exuberante são a comida e o sexo, que acredita estarem intrinsecamente ligadas. Por esta razão, leva diariamente a sua esposa, Giorgina, e o seu exótico “gang” ao “Le Hollandais”, conceituado restaurante francês do cozinheiro Richard.




Michael Gambon desempenha o papel de Spica de forma magnífica: a complexidade de um “thief” frustrado por não conseguir ter filhos, que ama verdadeiramente a sua esposa, contudo não consegue lidar com a impotência. Esta é apenas uma explicação para que Spica, com o desenrolar do filme, acabe por se tornar ainda mais irascível, por tratar mal todos os que o rodeiam e bater em Giorgina de forma sistemática.




Helen Mirren é Giorgina. Esta actriz recebeu um Óscar pelo seu desempenho no recente filme “A Rainha”, de Stephen Frears. O “The Cook, the thief, his wife and her lover” foi feito quase vinte anos antes, e Helen Mirren aparece como uma mulher com os seus quarenta anos, extremamente sensual e misteriosa. Aliás, tanto o “thief” (Gambon) como a “wife” (Mirren) são bastante superiores aos outros dois actores do quarteto.




Todavia, a história não é só a história, e a direcção artística é uma parte fundamental do filme. Posso começar por elogiar o guarda-roupa exclusivo de Jean-Paul Gaultier, duma sensualidade tremenda, inesquecível, principalmente no que respeita ao vestuário feminino. Ou a preocupação com as cores, às quais estão inerentes várias simbologias. O vermelho está presente na sala de jantar, onde há gula e luxúria, enquanto que o branco da casa de banho forma uma atmosfera mais pura. Consequentemente, Giorgina e o seu amante, o desinteressante Michael, apreciam a ironia, e o suposto local imaculado torna-se o mais propício para o início da paixão.




Um dos pormenores mais deliciosos tem a ver com os vestidos e as faixas dos fatos masculinos, que mudam de cor conforme o sítio por onde as personagens vagueiam, passando do azul no exterior, para o verde da cozinha, o vermelho da sala de jantar e o branco da casa de banho (apenas Michael continua impreterivelmente vestido de castanho). O efeito é conseguido através de um travelling horizontal, que parece atravessar as paredes, e onde está inserido um frame só com a parede negra, que possibilita o corte e a posterior mudança de guarda-roupa, sem prejudicar a continuidade da imagem.





A música, do conhecido Michael Nyman, começa por funcionar bem e ajudar todas as outras vertentes, mas cai no erro de se tornar monótona, repetitiva. Para além disso, a voz do menino soprano também não resulta.

Peter Greenaway recorreu a inúmeros long shots, auxiliados com um pouco de travelling (geralmente horizontal), que permitem ao espectador reparar em toda a beleza dos cenários e dos pormenores. Ao longo do tempo, a estética vai perdendo a novidade e, por vezes, o filme acaba por se tornar demasiado gráfico, descurando outros aspectos importantes.




No entanto, o argumento melhora de forma exponencial, até que se chega à poderosíssima cena final. A música, apesar de ouvida já tantas vezes, parece ter uma força diferente, e toda a tragédia é levada ao extremo (do nojo). Pode-se dizer que a imagem é arrepiante, devido também a uma óptima iluminação/fotografia e a uma longa sequência com um travelling genial.

Greenaway excedeu-se. Era também essa a sua missão. Arriscou, cometeu alguns erros e exageros, mas o resultado final é brilhante pela sua originalidade.





Tuesday, December 11, 2007

division


ele precisava dela. ela precisava de alguém. cozinhavam um para o outro. era ela que descascava a fruta.

ele: e agora não suporto comer pêras.
Fade away. Fade away.
Fade away. Fade away.
Fade away. Fade away.
Fade away.


ela dormia entre o tronco e o braço dele, normalmente o esquerdo.
ela: boa noite.
ele: dorme bem.
I feel it closing in,
As patterns seem to form.



até que um dia, passados poucos meses, talvez porque era Inverno e estava frio, ela enroscou também a perna.

ela: boa noite, amor.
e ele não conseguiu responder.
Don't ever fade away.
I need you here today.
Don't ever fade away.
Don't ever fade away.
Don't ever fade away.
Don't ever fade away.


nas noites seguintes ele não conseguiu dormir sempre com ela. às vezes pagava um quarto, numa residencial barata, e ficava a noite acordado, a olhar para os  candeeiros púrpura de veludo.

ela: foi aí que vi que ele não tinha estômago para o amor.
I feel it closing in,
I feel it closing in,
Day in, day out,
Day in, day out,
Day in, day out,
Day in, day out,
Day in, day out.



ele, na verdade, gostava muito dela. pediu-lhe desculpa, deu-lhe um coelho branco e beijou-a.

ela: nunca mais me faças uma coisa destas.
ele: prometo. amo-te.
Feel it closing in,
Feel it closing in,
The fear of whom I call,
Everytime I call



foram dizendo que se amavam. depois de uns tempos ele amava-a mesmo. mas ela já não dizia tantas vezes. 
ela: hoje não me apetece.
e esfregava a testa com força.
I feel it cold and warm.
The shadows start to fall.



sem perceber, ele tentou de tudo para a fazer feliz. tratava dela e do coelho melhor do que nunca.

ela: por favor não entres assim sem bater.
ele: desculpa. precisava de água oxigenada e de cotonetes.
ela: e fecha a porta quando saíres.

I'd have the world around,
To see just whatever happens,
I stood by the door alone.



estavam separados num mesmo espaço, numa mesma casa. ela nada sentia, precisava de outro alguém. as suas vidas eram miseráveis.

ela: desculpa, adeus.
e ele ficou sozinho a chorar.
And then it's fade away.
I see you fade away.




música: Digital, Joy Division


Monday, November 19, 2007

for my one and only and own antonio


neste mundo dos blogs, há aqueles como eu e há aqueles como ele. eu escrevo de vez em quando, e também me lembro de viver e conversar e massacrar a vida àqueles de quem gosto, que não são aqueles como ele mas aqueles como eu, que também gostam de conversar. não quer dizer que não goste daqueles como ele, mas com esses não consigo falar, nunca me respondem e dobram a pontinha dos dedos como sinal de irritação, coisa que eu acho, e todos aqueles como eu concordarão, absolutamente execrável.

no entanto, aqueles como ele escrevem muito mais e melhor. é também enervante estarem sempre a escrever e a produzir e a serem geniais. aqueles como eu e até aqueles como ele tem de ir espreitar todos os dias os novos textos, senão ficam perdidos numa quantidade exorbitante de letras e palavras e ideias. aqueles como ele devem escrever porque a mãe está a fazer o café, porque acabaram por tomar banho mais rápido, porque alguém daqueles como eu está a tentar iniciar uma conversa e mais vale escrever, ou até fingir que se escreve, para ver se o tal alguém como eu desiste e vai embora. aqueles como ele precisam apenas de 39 segundos (porque é o número daquele filme fascinante do hitchcock) para escrever algo brilhante.

na verdade, eu conheci um daqueles como ele, e aquilo é tudo treta. só fogo de vista. muito bem que demoram a responder, muito bem que continuam sem responder a muitas perguntas, muito bem que se enervam com a incompetência daqueles como eu, mas são mesmo fofinhos e riquinhos. são uma referência para qualquer um daqueles como eu. tchim tchim a eles **


Saturday, November 17, 2007

christina's world



a poem without blue, a painting without adjectives





she talked for hours
like there was nobody there.
Christina, why can't you see me
why do i still care?

your insanity consumes my heart
my mind burns with guilt.
my absence took you apart
a world for yourself you have built.

coldness.
we already died.
you stretch your arm to nothing.
Christina, we're no longer real,
we're just standing on the grass.



painting: andrew wyeth
poem: talysha vilp






Wednesday, November 7, 2007

conversas com ivone

ivone: Desejas a morte?
joão miguel: De vez em quando.
ivone: Acho que todos nós desejamos a morte. Não estou a dizer que seja uma coisa que invada a nossa mente todos os dias...
joão miguel: Para alguns é, acordam sempre negros e pesados por dentro, não conseguem pensar noutra coisa.
ivone: Sim, mas não estava a falar desses.
joão miguel: Estás a falar de quem?
ivone: De qualquer um.
joão miguel: Qualquer um? Eu? Tu? Qualquer um?
ivone: Sim, eu. Por exemplo. Também eu desejo a morte, de vez em quando. Não há nada de profundo ou revelador nisso. Não tem nada a ver com desânimo, ou mágoa, ou outra treta qualquer. Apenas me fascina a morte física. Não achas que tem a sua beleza?
joão miguel: Não sou como tu, Ivone. A ideia da dor da morte física aterroriza-me. Impede-me de arriscar. Faz de mim um cobarde. Um cobarde e um tipo saudável.
ivone: Um cobarde saudável. Mas então como é possível desejares acabar com a vida?
joão miguel: Trata-se de um desejo hipotético. Agrada-me a ideia de vir a ser nada. De desaparecer aos poucos das memórias. Os amigos esquecem-se rapidamente e a família cresce, evolui. Até que ninguém sabe que cheguei a existir. Ou, pelo menos, ninguém se lembra.
ivone: Que ideia mais absurda.
joão miguel: Penso que todo o desejo pela morte é absurdo. Qual é o teu?
ivone: Meramente experiencial. Quando atravesso as ruas ponho sempre a hipótese de me atirar para a frente de um carro. Como um impulso rápido e irracional, sabes? Sentir o corpo a explodir, ser projectado alguns metros. Deve ser tão bonito, como o último voo de um pássaro. Chegar ao chão já quase morta, com o tronco perfurado pelas costelas. Não fecharia os olhos e, se fosse um dia solarengo, não pensaria em mais nada nesses últimos momentos... apenas no agradável calor do asfalto.
joão miguel: E dizes tu que a minha ideia é absurda...
ivone: Mas nunca o farei. Acabo sempre por me lembrar que morreria.

Monday, October 22, 2007

el gatito de la suerte

Ainda não descobri qual a história do gatito de la suerte, mas acredito piamente que possui verdadeiros e únicos poderes místicos. Ora vejam:



El Gatito de la Suerte
es um gatito mui guapo
el te presentea con la muerte
si tu vida es afortunada

Péro, si tu vida es miserable
el gatito de la suerte
que tiene vidas siete
cambiará tu destino
y te trará mucha fortuna.